segunda-feira, 25 de julho de 2011

INFLUÊNCIA DO ORGANISMO


367 O Espírito, ao se unir ao corpo, se identifica com a matéria?
– A matéria é apenas o envoltório do Espírito, assim como a roupa é o
envoltório do corpo. O Espírito, ao se unir ao corpo, conserva o que é
próprio de sua natureza espiritual.
368 As faculdades ou dons do Espírito se exercem com toda a
liberdade após sua união com o corpo?
– O exercício das faculdades depende dos órgãos que lhes servem
de instrumento: são enfraquecidas pela grosseria da matéria.
368 a Assim, o corpo material seria um obstáculo à livre manifestação
das faculdades do Espírito, como um vidro opaco se opõe à livre
emissão da luz?
– Sim, é como um vidro muito opaco.
* Pode-se ainda comparar a ação da matéria grosseira do corpo
sobre o Espírito à de uma água lamacenta, que tira a liberdade dos
movimentos dos corpos nela mergulhados.
369 O livre exercício das faculdades da alma está subordinado
ao desenvolvimento dos órgãos?
– Os órgãos são os instrumentos da manifestação das faculdades da
alma; essa manifestação depende do desenvolvimento e grau de perfeição
desses mesmos órgãos, como a boa qualidade de um trabalho
depende da boa qualidade da ferramenta.
370 Pode-se deduzir que, da influência dos órgãos na ação das
faculdades do Espírito, possa haver uma relação entre o desenvolvimento
do cérebro e das qualidades morais e intelectuais?
– Não se deve confundir o efeito com a causa. O Espírito tem sempre
as faculdades que lhe são próprias. Não são, portanto, os órgãos que dão
as faculdades e sim as faculdades que conduzem ao desenvolvimento
dos órgãos.
370 a Assim sendo, a diversidade das aptidões no homem provém
unicamente do estado do Espírito?
– Unicamente não é o termo mais exato; as qualidades do Espírito,
que pode ser mais ou menos avançado, são o princípio; mas é preciso ter
em conta a influência da matéria, que limita mais ou menos o exercício
dessas faculdades.
* O Espírito, ao encarnar, traz certas predisposições, admitindo-se
para cada uma um órgão correspondente no cérebro; o desenvolvimento
desses órgãos será um efeito e não uma causa. Se as faculdades
tivessem seu princípio nos órgãos, o homem seria uma máquina sem
livre-arbítrio e sem responsabilidade por seus atos. Seria preciso admitir
que os maiores gênios, os sábios, poetas, artistas, são gênios apenas
porque o acaso lhes deu órgãos especiais, e que sem esses órgãos
não seriam gênios. Assim, o maior imbecil poderia ser um Newton,
um Virgílio (1) ou um Rafael (2), se tivesse possuído certos órgãos. Essa suposição
é mais absurda ainda quando aplicada às qualidades morais.
Assim, conforme esse sistema, um São Vicente de Paulo, dotado por
natureza desse ou daquele órgão, poderia ter sido um criminoso, e faltaria
ao maior criminoso apenas um órgão para ser um São Vicente de Paulo.
Admiti, ao contrário, que os órgãos especiais, se é que existem, são uma
conseqüência, que se desenvolvem pelo exercício da faculdade, assim como
os músculos, pelo movimento, e não tereis nada de irracional. Façamos
uma comparação simples, mas verdadeira: por meio de certos sinais fisionômicos,
reconheceis o homem dado à bebida; são esses sinais que o
tornam ébrio, ou é a embriaguez que faz surgirem esses sinais? Pode-se
dizer que os órgãos recebem a marca das faculdades.
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1 - Virgílio: Poeta latino. Autor da Eneida. Viveu entre 71 e 19 a.C (N. E.).
2 - Rafael: Rafael Sanzio (1483-1520) pintor, escultor e arquiteto italiano (N. E.).

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