quarta-feira, 29 de junho de 2011

IDÉIAS INATAS



218 O Espírito encarnado conserva algum traço das percepções
que teve e dos conhecimentos que adquiriu em suas existências anteriores?
– Ele possui uma vaga lembrança, que lhe dá o que se chama de
idéias inatas.
218 a A teoria das idéias inatas não é, portanto, uma fantasia?
– Não, os conhecimentos adquiridos em cada existência não se perdem.
O Espírito, liberto da matéria, sempre os conserva. Durante a
encarnação, pode esquecê-los em parte, momentaneamente, mas a in-
tuição que conserva deles o ajuda em seu adiantamento. Sem isso, teria
sempre que recomeçar. A cada nova existência, o Espírito parte de onde
estava na existência anterior.
218 b Pode, então, haver um grande vínculo entre duas existências
sucessivas?
– Nem sempre tão grande quanto podeis supor, porque as posições
são freqüentemente muito diferentes e, no intervalo delas, o Espírito pode
ter progredido. (Veja a questão 216.)
219 Qual é a origem das faculdades, das capacidades extraordinárias
dos indivíduos que, sem estudo prévio, parecem ter a intuição
de certos conhecimentos, como a língua, o cálculo, etc.?
– Lembrança do passado; progresso anterior da alma, mas do qual
nem mesmo ela tem consciência. De onde quereis que esses conhecimentos
venham? O corpo muda, mas o Espírito não, embora troque de
vestimenta.
220 Ao mudar de corpo, podem-se perder alguns talentos intelectuais,
não mais ter, por exemplo, o gosto pelas artes?
– Sim, se desonrou esse talento ou se fez dele um mau uso. Uma
capacidade intelectual pode, além do mais, permanecer adormecida numa
existência, porque o Espírito veio para exercitar uma outra que não tem
relação com ela. Então, qualquer talento pode permanecer em estado
latente para ressurgir mais tarde.
221 É a uma lembrança retrospectiva que o homem deve, mesmo
no estado selvagem, o sentimento instintivo da existência de Deus
e o pressentimento da vida futura?
– É uma lembrança que conservou do que sabia como Espírito antes
de encarnar; mas o orgulho muitas vezes sufoca esse sentimento.
221 a É a essa lembrança que se devem certas crenças relativas
à Doutrina Espírita e que se encontram em todos os povos?
– Essa Doutrina é tão antiga quanto o mundo; eis por que pode ser
encontrada em toda parte, sendo uma prova de que é verdadeira. O Espírito
encarnado, conservando a intuição de seu estado como Espírito, tem,
instintivamente, a consciência do mundo invisível, freqüentemente falseada
pelos preconceitos, acrescida da ignorância que a mistura com a
superstição.

terça-feira, 28 de junho de 2011

SEMELHANÇAS FÍSICAS E MORAIS


207 Os pais transmitem muitas vezes a seus filhos a semelhança
física. Eles também lhes transmitem alguma semelhança moral?
– Não, uma vez que têm almas ou Espíritos diferentes. O corpo procede
do corpo, mas o Espírito não procede do Espírito. Entre os descendentes
das raças há apenas consangüinidade.
207 a De onde vêm as semelhanças morais que existem algumas
vezes entre os pais e filhos?
– São Espíritos simpáticos atraídos pela semelhança de suas tendências.
208 O Espírito dos pais tem influência sobre o do filho após o
nascimento?
– Há uma influência muito grande. Como já dissemos, os Espíritos
devem contribuir para o progresso uns dos outros. Pois bem, os Espíritos
dos pais têm como missão desenvolver o de seus filhos pela educação. É
para eles uma tarefa: se falharem, serão culpados.
209 Por que pais bons e virtuosos geram, às vezes, filhos de
natureza perversa? Melhor dizendo, por que as boas qualidades dos
pais nem sempre atraem, por simpatia, um bom Espírito para animar
seu filho?
– Um Espírito mau pode pedir pais bons, na esperança de que seus
conselhos o orientem a um caminho melhor e, muitas vezes, Deus lhe
concede isso.
210 Os pais podem, por seus pensamentos e preces, atrair para
o corpo de um filho um Espírito bom em preferência a um Espírito
inferior?
– Não, mas podem melhorar o Espírito do filho que geraram e que lhes
foi confiado: é seu dever. Filhos maus são uma provação para os pais.
211 De onde vem a semelhança de caráter que muitas vezes
existe entre dois irmãos, especialmente entre gêmeos?
– Espíritos simpáticos que se aproximam por semelhança de sentimentos
e que se sentem felizes por estar juntos.
212 Nas crianças cujos corpos nascem ligados e que possuem
certos órgãos em comum há dois Espíritos, ou melhor, duas almas?
– Sim, há duas, são dois os corpos. Entretanto, a semelhança entre
eles é tanta que se afigura aos vossos olhos como se fossem uma só (6).
213 Visto que os Espíritos encarnam como gêmeos por simpatia,
de onde vem a aversão que se vê algumas vezes entre eles?
– Não é uma regra que os gêmeos sejam Espíritos simpáticos. Espíritos
maus podem querer lutar juntos no teatro da vida.
214 O que pensar das histórias de crianças gêmeas que brigam
no ventre da mãe?
– Lendas! Para dar idéia de que seu ódio era muito antigo, fizeram-no
presente antes de seu nascimento. Geralmente vós não levais em conta
as figuras poéticas.
215 De onde vem o caráter distintivo que se nota em cada povo?
– Os Espíritos também se agrupam em famílias formadas pela semelhança
de suas tendências mais ou menos depuradas, de acordo com
sua elevação. Pois bem! Um povo é uma grande família na qual se reúnem
Espíritos simpáticos. A tendência que têm os membros dessas grandes
famílias os leva a se unirem, daí se origina a semelhança que existe no
caráter distintivo de cada povo. Acreditais que Espíritos bons e caridosos
procurarão um povo duro e grosseiro? Não, os Espíritos simpatizam com
as coletividades, assim como simpatizam com os indivíduos; aí estão em
seu meio.
216 O homem conserva, em suas novas existências, traços do
caráter moral de existências anteriores?
– Sim, isso pode ocorrer; mas ao se melhorar, ele muda. Sua posição
social pode também não ser mais a mesma. Se de senhor torna-se escravo,
seus gostos serão completamente diferentes e teríeis dificuldade em
reconhecê-lo. Sendo o Espírito sempre o mesmo nas diversas encarnações,
suas manifestações podem ter uma ou outra semelhança, modificadas,
entretanto, pelos hábitos de sua nova posição, até que um aperfeiçoamento
notável venha mudar completamente seu caráter; por isso, de
orgulhoso e mau, pode tornar-se humilde e bondoso, desde que se tenha
arrependido.
217 O homem, pelo Espírito, conserva traços físicos das existências
anteriores em suas diferentes encarnações?
– O corpo que foi anteriormente destruído não tem nenhuma relação
com o novo. Entretanto, o Espírito se reflete no corpo. Certamente, o corpo
é apenas matéria, mas apesar disso é modelado de acordo com a
capacidade do Espírito que lhe imprime um certo caráter, principalmente
ao rosto, e é verdade quando se diz que os olhos são o espelho da alma,
ou seja, é o rosto que mais particularmente reflete a alma. É assim que
uma pessoa sem grande beleza tem, entretanto, algo que agrada quando
é animada por um Espírito bom, sábio, humanitário, enquanto existem rostos
muito belos que nada fazem sentir, podendo até inspirar repulsa.
Poderíeis pensar que apenas os corpos muito belos servem de envoltório
aos Espíritos mais perfeitos; entretanto, encontrais todos os dias homens
de bem sem nenhuma beleza exterior. Sem haver uma semelhança pronunciada,
a similitude dos gostos e das inclinações pode dar o que se
chama de um ‘ar de família’.
* Tendo em vista que o corpo que reveste a alma na nova encarnação
não tem necessariamente nenhuma relação com o da encarnação
anterior, uma vez que em relação a ele pode ter uma procedência completamente
diferente, seria absurdo admitir que numa sucessão de existências
ocorressem semelhanças que não passam de casuais. Entretanto,
as qualidades do Espírito modificam freqüentemente os órgãos
que servem às suas manifestações e imprimem ao semblante, e até
mesmo ao conjunto das maneiras, um cunho especial. É assim que, sob
o envoltório mais humilde, pode-se encontrar a expressão da grandeza
e da dignidade, enquanto sob a figura do grande senhor pode-se ver
algumas vezes a expressão da baixeza e da desonra. Algumas pessoas,
saídas da mais ínfima posição, adquirem, sem esforços, os hábitos e as
maneiras da alta sociedade. Parece que elas reencontram seu ambiente,
enquanto outras, apesar de seu nascimento e educação, estão nesse
mesmo ambiente sempre deslocadas. Como explicar esse fato senão
como um reflexo do que o Espírito foi antes?


6 - É o caso dos nascimentos dos xifópagos, também chamados irmãos siameses, em que os
corpos nascem ligados, e que por razões culturais e pelo desconhecimento das leis da reencarnação
eram, até há pouco tempo, tidos e exibidos como monstros. São na verdade Espíritos em
provas redentoras (N. E.).

segunda-feira, 27 de junho de 2011

PARENTESCO, FILIAÇÃO


203 Os pais transmitem aos filhos uma porção de sua alma ou
limitam-se a dar-lhes a vida animal a que uma nova alma, mais tarde,
vem acrescentar a vida moral?
– Dão-lhe apenas a vida animal, porque a alma é indivisível. Um pai
estúpido pode ter filhos inteligentes e vice-versa.
204 Uma vez que tivemos diversas existências, o parentesco pode
recuar além de nossa existência atual?
– Não pode ser de outra forma. A sucessão das existências corporais
estabelece entre os Espíritos laços que remontam às existências anteriores.
Daí muitas vezes decorrem as causas de simpatia entre vós e alguns
Espíritos que vos parecem estranhos.
205 Por que, aos olhos de certas pessoas, a doutrina da reencarnação
se apresenta como destruidora dos laços de família por fazêlos
recuar às existências anteriores?
– Ela não os destrói. Ela os amplia. O parentesco, estando fundado
em afeições anteriores, faz com que os laços que unem os membros de
uma mesma família sejam mais vigorosos. Essa doutrina amplia também
os deveres da fraternidade, uma vez que, entre os vossos vizinhos, ou
entre os servidores, pode-se encontrar um Espírito que esteve ligado a
vós pelos laços de sangue.
205 a Ela diminui, entretanto, a importância que alguns atribuem à
sua genealogia (5), uma vez que se pode ter tido por pai um Espírito que
pertenceu a outra raça, ou tendo vindo de uma condição bem diversa?
– É verdade, mas essa importância está fundada no orgulho. O que
essas pessoas honram em seus ancestrais são os títulos, a posição, a
fortuna. Alguém que coraria de vergonha por ter tido como antepassado
um honesto sapateiro se gabaria de descender de um nobre corrupto e
debochado. Mas o que quer que eles digam ou façam, não impedirão as
coisas de ser o que são, porque Deus não formulou as leis da natureza de
acordo com a vaidade deles.

206 Do fato de não haver ligações de filiação entre os Espíritos
de descendentes da mesma família, segue-se que o culto aos ancestrais
seja uma coisa ridícula?
– Certamente que não. Todo homem deve considerar-se feliz por pertencer
a uma família em que encarnam Espíritos elevados. Embora os
Espíritos não procedam uns dos outros, têm afeição aos que lhe estão
ligados pelos laços de família, porque esses Espíritos são freqüentemente
atraídos a esta ou àquela família em razão de simpatias ou ligações anteriores.
Mas, ficai certos: os Espíritos de vossos ancestrais não se sentem
honrados pelo culto que vós lhes ofereceis por orgulho. O valor dos méritos
que tiveram só se refletirão sobre vós pelo esforço que fizerdes em
seguir-lhes os bons exemplos, e, só assim, então, vossa lembrança pode
lhes ser agradável e útil.

5 - Genealogia: procedência e origem da família; os antepassados; linhagem (N. E.).

domingo, 26 de junho de 2011

SEXO NOS ESPÍRITOS


200 Os Espíritos têm sexo?
– Não como o entendeis, porque o sexo depende do organismo físico.
Existe entre eles amor e simpatia, mas fundados na identidade dos
sentimentos.
201 O Espírito que animou o corpo de um homem pode, em uma
nova existência, animar o de uma mulher e vice-versa?
– Sim, são os mesmos Espíritos que animam os homens e as mulheres.
202 Quando está na erraticidade, o Espírito prefere encarnar no
corpo de um homem ou de uma mulher?
– Isso pouco importa ao Espírito. Depende das provas que deve
suportar.
* Os Espíritos encarnam como homens ou mulheres, porque não
têm sexo. Como devem progredir em tudo, cada sexo, assim como
cada posição social, lhes oferece provas, deveres especiais e a ocasião
de adquirir experiência. Aquele que encarnasse sempre como homem
apenas saberia o que sabem os homens.

sábado, 25 de junho de 2011

DESTINAÇÃO DAS CRIANÇAS APÓS A MORTE


197 O Espírito de uma criança que desencarna em tenra idade
poderá ser tão avançado quanto o de um adulto?
– Algumas vezes é mais, porque pode ter vivido muito mais e ter mais
experiência, principalmente se progrediu.
197 a O Espírito de uma criança pode, então, ser mais avançado
do que o de seu pai?
– Isso é muito freqüente. Vós mesmos não vedes isso muitas vezes
na Terra?
198 De uma criança que morre em tenra idade, e, portanto, não
tendo praticado o mal, podemos supor que seu Espírito pertença aos
graus superiores?
– Se não fez o mal, não fez o bem, e Deus não a isenta das provações
que deve passar. Seu grau de pureza não ocorre porque tenha animado o
corpo de uma criança, mas pelo progresso que já realizou.
199 Por que a vida é muitas vezes interrompida na infância?
– A duração da vida de uma criança pode ser, para o Espírito que nela
está encarnado, o complemento de uma existência anterior interrompida
antes do tempo. Sua morte é, muitas vezes, também uma provação ou
uma expiação para os pais.
199 a O que acontece com o Espírito de uma criança que morre
em tenra idade?
– Ela recomeça uma nova existência.
* Se o homem tivesse apenas uma existência e se, depois dela, sua
destinação futura fosse fixada perante a eternidade, qual seria o mérito
de metade da espécie humana que morre em tenra idade, para desfrutar,
sem esforços, da felicidade eterna? E com que direito ficaria desobrigada
e livre das condições, muitas vezes tão duras, impostas à outra
metade? Tal ordem de coisas não estaria de acordo com a justiça de
Deus. Pela reencarnação, a igualdade é para todos. O futuro pertence a
todos sem exceção e sem favorecer a ninguém. Os que se retardam
não podem culpar senão a si mesmos. O homem deve ter o mérito de
seus atos, como tem de sua responsabilidade.
Além do mais, não é racional considerar a infância como um estado
normal de inocência. Não se vêem crianças dotadas dos piores instintos
numa idade em que a educação ainda não pôde exercer sua influência?
Não há algumas que parecem trazer do berço a astúcia, a falsidade, a
malícia, até mesmo o instinto de roubo e de homicídio, apesar dos bons
exemplos que lhe são dados de todos os lados? A lei civil as absolve de
seus delitos, porque considera que agem sem discernimento. E tem razão,
porque, de fato, agem mais instintivamente do que pela própria vontade.
Porém, de onde podem se originar esses instintos tão diferentes em crianças
da mesma idade, educadas nas mesmas condições e submetidas às
mesmas influências? De onde vem essa perversidade precoce, senão da
inferioridade do Espírito, uma vez que a educação em nada contribuiu para
isso? As que são dadas a vícios, é porque seu Espírito progrediu menos e,
portanto, sofrem as conseqüências, não por seus atos de infância, mas por
aqueles de suas existências anteriores. E é desse modo que a lei é igual
para todos, e a justiça de Deus a todos alcança.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

TRANSMIGRAÇÃO (3) PROGRESSIVA



189 Desde o princípio de sua formação, o Espírito desfruta da
plenitude de suas faculdades?
– Não, o Espírito, assim como o homem, tem também sua infância.
Na origem, os Espíritos têm somente uma existência instintiva e mal têm
consciência de si mesmos e de seus atos. É pouco a pouco que a inteligência
se desenvolve.
190 Qual é o estado da alma em sua primeira encarnação?
– É o estado de infância na vida corporal. Sua inteligência apenas
desabrocha: a almaensaia para a vida.
191 As almas de nossos selvagens são almas em estado de infância?
– De infância relativa; são almas já desenvolvidas, pois já sentem
paixões.
191 a As paixões são, então, um sinal de desenvolvimento?
– De desenvolvimento sim, mas não de perfeição. As paixões são um
sinal da atividade e da consciência do eu, visto que, na alma primitiva, a
inteligência e a vida estão em estado de germe.
A vida do Espírito, em seu conjunto, passa pelas mesmas fases que
vemos na vida corporal. Gradualmente, passa do estado de embrião ao
de infância para atingir, no decurso de uma sucessão de períodos, o de
adulto, que é o da perfeição, com a diferença de que não conhece o
declínio e a decrepitude, isto é, a velhice extrema como na vida corporal.
Essa vida, que teve começo, não terá fim; precisa de um tempo
imenso, do nosso ponto de vista, para passar da infância espírita a um
desenvolvimento completo, e seu progresso se realiza não somente num
único mundo, mas passando por diversos mundos. A vida do Espírito se
compõe, assim, de uma série de existências corporais, e cada uma delas
é uma ocasião para o seu progresso, como cada existência corporal
se compõe de uma série de dias em cada um dos quais o homem adquire
um acréscimo de experiência e instrução. Mas, da mesma forma
que, na vida do homem, há dias que não trazem nenhum proveito, também
na do Espírito há existências corporais sem resultado, por não as
ter sabido aproveitar.
192 Pode-se, na vida atual, por efeito de uma conduta perfeita,
superar todos os graus e tornar-se um Espírito puro sem passar por
graus intermediários?
– Não, porque o que para o homem parece perfeito está longe da
perfeição. Existem qualidades que lhe são desconhecidas e que não pode
compreender. Ele pode ser tão perfeito quanto comporte a perfeição de
sua natureza terrestre, mas não é a perfeição absoluta. Da mesma forma
que uma criança, por mais precoce que seja, tem que passar pela juventude
antes de alcançar a idade madura; e um doente tem que passar pelo
estado de convalescença antes de recuperar a saúde. Aliás, o Espírito
deve avançar em ciência e moralidade; se progrediu apenas num deles, é
preciso que progrida no outro, para atingir o alto da escala. Porém, quanto
mais o homem avança em sua vida presente, menos longas e difíceis
serão as provas futuras.
192 a O homem pode, pelo menos, assegurar nesta vida uma
existência futura menos cheia de amarguras?
– Sim, sem dúvida, pode abreviar a extensão e reduzir as dificuldades
do caminho. Só o negligente se encontra sempre na mesma situação.
193 Um homem, numa futura existência, pode descer mais baixo
do que na atual?
– Como posição social, sim; como Espírito, não.
194 A alma de um homem de bem pode, numa nova encarnação,
animar o corpo de um perverso?
– Não. Ela não pode regredir.
194 a A alma de um homem perverso pode tornar-se a de um
homem de bem?
– Sim, se houver arrependimento, o que, então, é uma recompensa.
* A marcha dos Espíritos é progressiva e não retrógrada. Elevam-se
gradualmente na hierarquia e não descem da categoria que já alcançaram.
Em suas diferentes existências corporais podem descer como homens,
mas não como Espíritos. Assim, a alma de um poderoso da Terra
pode mais tarde animar o mais humilde operário, e vice-versa; essas
posições entre os homens ocorrem muitas vezes na razão inversa dos
sentimentos morais. Herodes era rei e Jesus, carpinteiro.
195 A possibilidade de se melhorar numa outra existência não
pode levar certas pessoas a perseverar no mau caminho, pelo pensamento
de que poderão sempre se corrigir mais tarde?
– Aquele que pensa assim não acredita em nada, e nem a idéia de um
castigo eterno o amedrontaria mais do que qualquer outra, porque sua
razão a repele, e essa idéia leva-o à incredulidade a respeito de tudo. Se
unicamente se tivessem empregado meios racionais para orientar os homens,
não haveria tantos céticos. Um Espírito imperfeito pode, de fato,
durante sua vida corporal, pensar como dizeis; mas, uma vez libertado da
matéria, pensa de outra forma, porque logo se apercebe de que fez um
cálculo errado e, então, virá consciente de um sentimento contrário a esse,
na sua nova existência. É assim que se realiza o progresso e é por essa
razão que existem na Terra homens mais avançados que outros; uns já
possuem a experiência que outros ainda não têm, mas que adquirirão
pouco a pouco. Depende deles impulsionar o seu próprio progresso ou
retardá-lo indefinidamente.
* O homem que se encontra numa posição má deseja trocá-la o mais
depressa possível. Aquele que está convencido de que as dificuldades desta
vida são a conseqüência de suas imperfeições procurará garantir uma nova
existência menos sofrida, e esse pensamento o desviará mais depressa do
caminho do mal do que a idéia do fogo eterno, em que não acredita.
196 Se os Espíritos apenas podem melhorar-se suportando as
dificuldades da existência corporal, segue-se que a vida material seria
uma espécie de cadinho (4) ou depurador por onde devem passar
para alcançar a perfeição?
– Sim, é exatamente assim. Eles se melhoram nessas provações evitando
o mal e praticando o bem. Mas é só depois de várias encarnações
ou depurações sucessivas que atingem o objetivo a que se destinam após
um tempo mais ou menos longo e de acordo com seus esforços.
196 a É o corpo que influi sobre o Espírito para melhorá-lo, ou o
Espírito que influi sobre o corpo?
– Teu Espírito é tudo; teu corpo é uma vestimenta que apodrece; eis tudo.
* No suco da videira, nós encontramos uma comparação semelhante
aos diferentes graus da depuração da alma. Ele contém o licor chamado
espírito ou álcool, mas enfraquecido por uma série de matérias estranhas
que lhe alteram a essência. Essa essência só atinge a pureza
absoluta após diversas destilações, em cada uma das quais se depura
das várias impurezas. O corpo é o alambique no qual a alma deve entrar
para se depurar; as matérias estranhas são como o perispírito que se
depura à medida que o Espírito se aproxima da perfeição.


3 - Transmigração: passagem da alma de um corpo para outro (N. E.).

4 - Cadinho: vaso refratário onde se fundem os metais. Neste caso, local em que os sentimentos são apurados (N. E.).

quinta-feira, 23 de junho de 2011

ENCARNAÇÃO NOS DIFERENTES MUNDOS


172 Nossas diferentes existências corporais se passam todas na
Terra?
– Não, nem todas, mas em diferentes mundos. As que passamos na
Terra não são nem as primeiras nem as últimas, embora sejam das mais
materiais e mais distantes da perfeição.
173 A alma, a cada nova existência corporal, passa de um mundo
para outro ou pode ter várias existências num mesmo globo?
– Ela pode reviver diversas vezes num mesmo globo, se não for suficientemente
avançada para passar a um mundo superior.
173 a Desse modo, podemos reaparecer muitas vezes na Terra?
– Certamente.
173 b Podemos voltar à Terra após ter vivido em outros mundos?
– Seguramente. Já vivestes em outros mundos além da Terra.
174 Voltar a viver na Terra é uma necessidade?
– Não; mas se não avançardes, podereis ir para um outro mundo que
não seja melhor e que pode até ser pior.
175 Existe alguma vantagem em voltar a habitar a Terra?
– Nenhuma vantagem em particular, a menos que se esteja em missão.
Nesse caso se progride aí como em qualquer outro mundo.
175 a Não seria melhor permanecer como Espírito?
– Não, não. Seria permanecer estacionário, e o que se quer é avançar
para Deus.
176 Os Espíritos, após terem encarnado em outros mundos, podem
encarnar neste, sem nunca terem passado por aqui?
– Sim, como vós em outros mundos. Todos os mundos são
solidários: o que não se cumpre em um se cumpre em outro.
176 a Desse modo, há homens que estão na Terra pela primeira vez?
– Há muitos e em diversos graus.
176 b Pode-se reconhecer por um sinal qualquer quando um Espírito
está pela primeira vez na Terra?
– Isso não teria nenhuma utilidade.
177 Para chegar à perfeição e à felicidade suprema, que são o
objetivo final de todos os homens, o Espírito deve passar por todos os
mundos que existem no universo?
– Não. Há muitos mundos que estão num mesmo grau da escala
evolutiva e onde o Espírito não aprenderia nada de novo.
177 a Como então explicar a pluralidade dessas existências num
mesmo globo?
– O Espírito pode aí se encontrar a cada vez em posições bem diferentes,
que são para ele outras ocasiões de adquirir experiência.
178 Os Espíritos podem encarnar corporalmente num mundo relativamente
inferior àquele em que já viveram?
– Sim, se for para cumprir uma missão e ajudar no progresso. Aceitam
com alegria as dificuldades dessa existência, porque lhes oferecem um
meio de avançar.
178 a Isso não pode ocorrer por expiação? Deus não pode enviar
Espíritos rebeldes para mundos inferiores?
– Os Espíritos podem permanecer estacionários, mas não regridem.
Quando estacionam, sua punição é não avançar e ter de recomeçar as
existências mal-empregadas num meio conveniente à sua natureza.
178 b Quais são aqueles que devem recomeçar a mesma existência?
– Os que falharam em sua missão ou em suas provações.
179 Os seres que habitam cada mundo atingiram um mesmo grau
de perfeição?
– Não, é como na Terra: há seres mais avançados e menos avançados.
180 Ao passar deste mundo para um outro, o Espírito conserva a
inteligência que tinha aqui?
– Sem dúvida, a inteligência não se perde, mas pode não ter os mesmos
meios de manifestá-la; isso depende de sua superioridade e das
condições do corpo que vai tomar. (Veja “Influência do organismo”, Parte
Segunda, cap. 7).
181 Os seres que habitam os diferentes mundos possuem corpo
semelhante aos nosso?
– Sem dúvida possuem corpo, porque é preciso que o Espírito esteja
revestido de matéria para agir sobre a matéria. Porém, esse corpo é mais
ou menos material, de acordo com o grau de pureza a que chegaram os
Espíritos. E é isso que diferencia os mundos que devem percorrer; porque
há muitas moradas na casa de nosso Pai e, portanto, muitos graus. Alguns
o sabem e têm consciência disso na Terra; outros não sabem nada.
182 Podemos conhecer exatamente o estado físico e moral dos
diferentes mundos?
– Nós, Espíritos, só podemos responder de acordo com o grau de
adiantamento em que vos encontrais. Portanto, não devemos revelar essas
coisas a todos, visto que nem todos terão alcance de compreendê-las,
e isso os perturbaria.
* À medida que o Espírito se purifica, o corpo que o reveste se aproxima
igualmente da natureza espírita. A matéria torna-se menos densa,
ele não mais se arrasta em sofrimento pela superfície do solo, as necessidades
físicas são menos grosseiras e os seres vivos não têm mais
necessidade de se destruírem mutuamente para se alimentar. O Espírito
é mais livre e, para atingir coisas distantes, tem percepções que nos são
desconhecidas. Ele vê pelos olhos do corpo o que apenas pelo pensamento
podemos imaginar.
A purificação dos Espíritos reflete-se na perfeição moral dos seres
em que estão encarnados. As paixões brutais se enfraquecem e o egoísmo
dá lugar a um sentimento fraternal. É desse modo que, nos mundos
superiores à Terra, as guerras são desconhecidas, os ódios e as discórdias
não têm motivo, porque ninguém pensa em fazer o mal a seu semelhante.
A intuição que têm do futuro, a segurança que uma consciência
livre de remorsos lhes dá, fazem com que a morte não lhes cause
nenhuma apreensão, por isso a encaram sem temor e a compreendem
como uma simples transformação.
A duração da vida nos diferentes mundos parece ser proporcional
ao grau de superioridade física e moral desses mundos, e isso é perfeitamente
racional. Quanto menos material é o corpo, menos está sujeito
às alternâncias e instabilidades que o desorganizam. Quanto mais puro
é o Espírito, mais livre das paixões que o destroem. Esse é ainda um
benefício da Providência que, desse modo, abrevia os sofrimentos.
183 Ao ir de um mundo para outro, o Espírito passa por uma nova
infância?
– A infância é em todos os lugares uma transição necessária, mas não
é tão frágil em todos os lugares como entre vós, na Terra.
184 O Espírito pode escolher o novo mundo que vai habitar?
– Nem sempre, mas pode pedir e conseguir isso se o merecer; porque
os mundos são acessíveis aos Espíritos de acordo com seu grau de
elevação.
184 a Se o Espírito não pede nada, o que determina o mundo em
que deve reencarnar?
– O grau de sua elevação.
185 O estado físico e moral dos seres vivos é perpetuamente o
mesmo em cada globo?
– Não; os mundos estão também submetidos à lei do progresso (2).
Todos começaram como o vosso, por um estado inferior, e a própria Terra
passará por uma transformação semelhante. Ela será um paraíso quando
os homens se tornarem bons.
* É assim que as raças que hoje povoam a Terra desaparecerão um
dia e serão substituídas por seres cada vez mais perfeitos. Essas raças
transformadas sucederão às atuais, como as atuais sucederam a outras
ainda mais atrasadas.
186 Há mundos em que o Espírito, deixando de habitar um corpo
material, tem apenas como envoltório o perispírito?
– Sim, há. Nesses mundos até mesmo esse envoltório, o perispírito,
torna-se tão etéreo que para vós é como se não existisse. É o estado dos
Espíritos puros.
186 a Disso parece resultar que não há uma demarcação definida
entre o estado das últimas encarnações e o de Espírito puro?
– Essa demarcação não existe. A diferença nesse caso se desfaz
pouco a pouco, torna-se imperceptível, assim como a noite se desfaz diante
dos primeiros clarões da alvorada.
187 A substância do perispírito é a mesma em todos os globos?
– Não; é mais ou menos etérea. Ao passar de um mundo para outro,
o Espírito se reveste instantaneamente da matéria própria de cada um
deles, com a rapidez de um relâmpago.
188 Os Espíritos puros habitam mundos especiais, ou estão no espaço
universal, sem estar ligados mais a um mundo do que a outro?
– Os Espíritos puros habitam determinados mundos, mas não estão
restritos a eles como os homens estão à Terra; eles podem, melhor do que
os outros, estar em todos os lugares*.

* De acordo com o ensinamento dos Espíritos, de todos os globos que compõem o nosso sistema planetário, a Terra é onde os habitantes são menos avançados, tanto física quanto moralmente. Marte ainda estaria inferior, e Júpiter muito superior em todos os sentidos. O Sol não seria um mundo habitado por seres corporais, e sim um lugar de encontro de Espíritos superiores que, de lá, irradiam seus pensamentos para outros mundos, que dirigem por intermédio de Espíritos menos elevados, transmitindo-os a eles por meio do fluido universal. Como constituição física, o Sol seria um foco de eletricidade. Todos os sóis parecem estar numa posição idêntica.
O volume e a distância que estão do Sol não têm nenhuma relação necessária com o grau de adiantamento dos mundos, pois parece que Vênus é mais avançado que a Terra, e Saturno menos que Júpiter.
Muitos Espíritos que na Terra animaram pessoas conhecidas disseram estar encarnados em Júpiter, um dos mundos mais próximos da perfeição, e é admirável ver, nesse globo tão avançado, homens que, na opinião geral que fazemos deles, não eram reconhecidos como tão elevados. Isso não deve causar admiração, se considerarmos que alguns Espíritos que habitam Júpiter podem ter sido enviados à Terra para cumprir uma missão que, aos nossos olhos, não os colocava em primeiro plano; que, entre sua existência terrestre e a de Júpiter, podem ter tido outras intermediárias, nas quais se melhoraram. E, finalmente, que nesse mundo, como no nosso, há diferentes graus de desenvolvimento, e que entre esses graus pode haver a mesma distância como a que separa entre nós o selvagem do homem civilizado. Desse modo, o fato de habitarem Júpiter não quer dizer que estão no mesmo padrão dos seres mais avançados de lá, da mesma forma que não se está no mesmo padrão de um sábio da Universidade só porque se reside em Paris.
As condições de longevidade não são também as mesmas que na Terra, e por isso não se pode comparar a idade. Um Espírito evocado, desencarnado há alguns anos, disse estar encarnado há seis meses num mundo cujo nome nos é desconhecido. Interrogado sobre a idade que tinha nesse mundo, respondeu: “Não posso avaliá-la, porque não contamos o tempo como vós; além do mais, o modo de vida não é o mesmo; desenvolvemo-nos lá com muito mais rapidez; embora não faça mais que seis dos vossos meses que lá estou, posso dizer que, quanto à inteligência, tenho trinta anos da idade que tive na Terra”. Muitas respostas semelhantes nos foram dadas por outros Espíritos, e isso nada tem de inacreditável.
Não vemos na Terra um grande número de animais adquirir em poucos meses seu desenvolvimento normal? Por que não poderia ocorrer o mesmo com os habitantes de outras esferas?
Notemos, por outro lado, que o desenvolvimento adquirido pelo homem na Terra, na idade de trinta anos, pode ser apenas uma espécie de infância, comparado ao que deve alcançar. Bem curto de vista se revela quem nos toma em tudo por protótipos da criação, e é rebaixar a Divindade crer que, fora o homem, nada mais é possível a Deus (N. K.).


2 - Assunto abordado nesta obra, na Parte Terceira, cap. 8 (N. E.).

quarta-feira, 22 de junho de 2011

JUSTIÇA DA REENCARNAÇÃO

171 Em que se baseia o dogma (1) da reencarnação?
– Na justiça de Deus e na revelação, e repetimos incessantemente:
um bom pai deixa sempre para seus filhos uma porta aberta ao arrependimento.
A razão não vos diz que seria injusto privar, para sempre, da felicidade
eterna todos aqueles cujo aprimoramento não dependeu deles mesmos?
Não são todos os homens filhos de Deus? Só homens egoístas podem
pregar a injustiça, o ódio implacável e os castigos sem perdão.
* Todos os Espíritos estão destinados à perfeição, e Deus lhes fornece
os meios de alcançá-la pelas provações da vida corporal. Mas, na
Sua justiça, lhes permite cumprir, em novas existências, o que não puderam
fazer, ou acabar, numa primeira prova.
Não estaria de acordo nem com a igualdade, a justiça, nem com a
bondade de Deus condenar para sempre os que encontraram, no
próprio meio em que viveram, obstáculos ao seu melhoramento, independentemente
de sua vontade. Se a sorte do homem estivesse irrevogavelmente
fixada após a morte, Deus não teria pesado as ações de
todos numa única e mesma balança e não agiria com imparcialidade.
A doutrina da reencarnação, que consiste em admitir para o homem
diversas existências sucessivas, é a única que responde à idéia
que fazemos da justiça de Deus em relação aos homens que se acham
numa condição moral inferior; a única que pode nos explicar o futuro e
firmar nossas esperanças, porque nos oferece o meio de resgatar nossos
erros por novas provações. A razão nos demonstra essa doutrina e
os Espíritos a ensinam.
O homem que tem consciência de sua inferioridade encontra na
doutrina da reencarnação uma esperança consoladora. Se acredita na
justiça de Deus, não pode esperar achar-se, perante a eternidade, em
pé de igualdade com aqueles que agiram melhor do que ele. Contudo, o
pensamento de que essa inferioridade não o exclui para sempre do bem
supremo que conquistará mediante novos esforços o sustenta e lhe
reanima a coragem. Quem é que, no término de sua caminhada, não
lamenta ter adquirido muito tarde uma experiência que não pode mais
aproveitar? Porém, essa experiência tardia não está perdida; tirará proveito
dela numa nova vida.


1 - Dogma: essa palavra adquiriu de forma genérica o significado de um princípio, um ponto de
doutrina infalível e indiscutível. Porém, o seu verdadeiro sentido não é esse. A Doutrina Espírita
não é dogmática no sentido que se conhece em alguns credos religiosos que adotam o princípio
de filosofia em que a fé se sobrepõe à razão (fideísmo) para acomodar e justificar suas posições
de crença.
A palavra dogma está aqui com o seu significado, isto é, a união de um fundamento, um princípio
divino, com a experiência humana. Allan Kardec a emprega aqui e nas demais obras da Codificação
Espírita com esse sentido, e igualmente os Espíritos se referiram ao dogma da reencarnação com
essa significação, como se vê na resposta e à frente, na Parte Segunda, cap. 5, desta obra (N. E.).

terça-feira, 21 de junho de 2011

PLURALIDADE DAS EXISTÊNCIAS


A REENCARNAÇÃO
166 Como a alma, que não alcançou a perfeição durante a vida
corporal, pode acabar de se depurar?
– Submetendo-se à prova de uma nova existência.
166 a Como a alma realiza essa nova existência? É pela sua
transformação como Espírito?
– A alma, ao se depurar, sofre sem dúvida uma transformação, mas
para isso é preciso que passe pela prova da vida corporal.
166 b A alma tem, portanto, que passar por muitas existências
corporais?
– Sim, todos nós temos muitas existências. Os que dizem o
contrário querem vos manter na ignorância em que eles próprios se encontram.
Esse é o desejo deles.
166 c Desse princípio parece resultar que a alma, após ter deixado
um corpo, toma outro, ou seja, reencarna em um novo corpo. É
assim que se deve entender?
– Evidentemente.
167 Qual é o objetivo da reencarnação?
– Expiação, melhoramento progressivo da humanidade. Sem isso, onde
estaria a justiça?
168 O número de existências corporais é limitado ou o Espírito
reencarna perpetuamente?
– A cada nova existência, o Espírito dá um passo no caminho do
progresso. Quando se libertar de todas as suas impurezas, não tem mais
necessidade das provações da vida corporal.
169 O número de encarnações é o mesmo para todos os Espíritos?
– Não; aquele que caminha rápido se poupa das provas. Todavia,
essas encarnações sucessivas são sempre muito numerosas, porque o
progresso é quase infinito.
170 Em que se torna o Espírito após sua última encarnação?
– Espírito bem-aventurado; é um Espírito puro.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

PERTURBAÇÃO ESPIRITUAL


163 A alma, ao deixar o corpo, tem imediatamente consciência
de si mesma?
– Consciência imediata não. Ela passa algum tempo como num estado
de perturbação.
164 Todos os Espíritos experimentam, no mesmo grau e com a
mesma duração, a perturbação que se segue à separação da alma e
do corpo?
– Não, isso depende de sua elevação. Aquele que já está depurado
reconhece a sua nova situação quase imediatamente, porque já se libertou
da matéria durante a vida do corpo, enquanto o homem carnal, aquele
cuja consciência não é pura, conserva durante muito mais tempo as sensações
da matéria.
165 O conhecimento do Espiritismo tem alguma influência sobre
a duração, mais ou menos longa, dessa perturbação?
– Uma influência muito grande, uma vez que o Espírito já compreendia
antecipadamente sua situação. Mas a prática do bem e a consciência
pura exercem maior influência.
* No momento da morte, tudo é inicialmente confuso; a alma necessita
de algum tempo para se reconhecer. Ela fica atordoada, semelhante
à situação de uma pessoa que desperta de um profundo sono e procura
se dar conta da situação. A lucidez das idéias e a memória do passado
voltam à medida que se apaga a influência da matéria da qual acaba de
se libertar e à medida que se vai dissipando uma espécie de névoa que
obscurece seus pensamentos.
O tempo da perturbação que se segue à morte do corpo é bastante
variável. Pode ser de algumas horas, de muitos meses ou até mesmo de
muitos anos. É menos longa para aqueles que se identificaram já na vida
terrena com seu estado futuro, porque compreendem imediatamente
sua posição.
Essa perturbação apresenta circunstâncias particulares de acordo
com o caráter dos indivíduos e, principalmente, com o gênero de morte.
Nas mortes violentas, por suicídio, suplício, acidente, apoplexia3, ferimentos,
etc., o Espírito fica surpreso, espantado e não acredita estar
morto. Sustenta essa idéia com insistência e teimosia. Entretanto, vê
seu corpo, sabe que é o seu e não compreende que esteja separado
dele. Procura aproximar-se de pessoas que estima, fala com elas e não
compreende por que não o escutam. Essa ilusão dura até o completo
desprendimento do perispírito. Só então o Espírito reconhece o estado
em que se encontra e compreende que não faz mais parte do mundo
dos vivos. Esse fenômeno se explica facilmente. Surpreendido pela morte,
o Espírito fica atordoado com a brusca mudança que se operou nele. A
morte é, para ele, sinônimo de destruição, de aniquilamento. Mas, como
ainda pensa, vê, escuta, não se considera morto. O que aumenta ainda
mais sua ilusão é o fato de se ver num corpo semelhante ao anterior,
cuja natureza etérea não teve ainda tempo de estudar. Acredita que seja
sólido e compacto como o primeiro; e quando percebe esse detalhe, se
espanta por não poder apalpá-lo. Esse fenômeno é semelhante ao que
acontece com os sonâmbulos inexperientes que não acreditam dormir,
porque, para eles, o sono é sinônimo de suspensão das atividades, e,
como podem pensar livremente e ver, julgam não estar dormindo. Alguns
Espíritos apresentam essa particularidade, embora a morte não tenha acontecido
inesperadamente. Porém, é sempre mais generalizada naqueles
que, apesar de estar doentes, não pensavam em morrer. Vê-se, então, o
singular espetáculo de um Espírito assistir ao seu enterro como sendo
o de um estranho e falando sobre o assunto como se não lhe dissesse
respeito, até o momento em que compreende a verdade.
A perturbação que se segue à morte nada tem de pesaroso para o
homem de bem! É calma e muito semelhante à de um despertar tranqüilo.
Para aquele cuja consciência não é pura, a perturbação é cheia de
ansiedade e angústias que aumentam à medida que reconhece a situação
em que se encontra.
Nos casos de morte coletiva, tem-se observado que os que perecem
ao mesmo tempo nem sempre se revêem imediatamente. Na perturbação
que se segue à morte, cada um vai para seu lado, ou apenas
se preocupa com aqueles que lhe interessam.


3 - Apoplexia: lesão cerebral aguda; derrame cerebral (N. E.).

domingo, 19 de junho de 2011

SEPARAÇÃO DA ALMA E DO CORPO


154 O corpo ou a alma sente alguma dor no momento da morte?
– Não; o corpo sofre muitas vezes mais durante a vida do que no
momento da morte: a alma não toma nenhuma parte nisso. Os sofrimentos
que às vezes ocorrem no momento da morte são uma alegria para o
Espírito, que vê chegar o fim de seu exílio.
* Na morte natural, a que acontece pelo esgotamento dos órgãos em
conseqüência da idade, o homem deixa a vida sem se dar conta disso:
é como um foco de luz que se apaga por falta de suprimento.
155 Como se opera a separação da alma e do corpo?
– Quando os laços que a retinham se rompem, ela se desprende.
155 a A separação se opera instantaneamente e por uma transição
brusca? Há uma linha de demarcação nitidamente traçada entre
a vida e a morte?
– Não; a alma se desprende gradualmente e não escapa como um
pássaro cativo subitamente libertado. Esses dois estados se tocam e se
confundem de maneira que o Espírito se desprende pouco a pouco dos
laços que o retinham no corpo físico: eles se desatam, não se quebram.
* Durante a vida, o Espírito se encontra preso ao corpo por seu
envoltório semimaterial ou perispírito. A morte é apenas a destruição do
corpo e não do perispírito, que se separa do corpo quando nele cessa a
vida orgânica. A observação demonstra que, no instante da morte, o
desprendimento do perispírito não se completa subitamente; opera-se
gradualmente e com uma lentidão muito variável, conforme os indivíduos.
Para uns é bastante rápido e pode-se dizer que o momento da morte é
ao mesmo instante o da libertação, quase imediata. Mas, para outros,
aqueles cuja vida foi extremamente material e sensual, o desprendimento
é mais demorado e dura algumas vezes dias, semanas e até mesmo
meses. Isso sem que haja no corpo a menor vitalidade nem a possibilidade
de um retorno à vida, mas uma simples afinidade entre corpo e
Espírito, afinidade que sempre se dá em razão da importância que, durante
a vida, o Espírito deu à matéria. É racional conceber, de fato, que
quanto mais o Espírito se identifica com a matéria, mais sofre ao se
separar dela. Por outro lado, a atividade intelectual e moral, a elevação
de pensamentos, operam um início do desprendimento mesmo durante
a vida do corpo, de tal forma que, quando a morte chega, o desprendimento
é quase instantâneo. Esse é o resultado de estudos feitos em
todos os indivíduos observados no momento da morte. Essas observações
ainda provaram que a afinidade que em alguns indivíduos persiste
entre a alma e o corpo é, algumas vezes, muito dolorosa, visto que o
Espírito pode sentir o horror da decomposição. Esse caso é excepcional
e particular para certos gêneros de vida e certos gêneros de morte;
verifica-se entre alguns suicidas.
156 A separação definitiva da alma do corpo pode ocorrer antes
da completa cessação da vida orgânica?
– Na agonia, a alma, algumas vezes, já deixou o corpo. Nada mais resta
nele do que a vida orgânica. O homem não tem mais consciência de si
mesmo e, entretanto, ainda há nele um sopro de vida orgânica. O corpo é
uma máquina que o coração faz mover. Existe, enquanto o coração faz circular
o sangue em suas veias, e não tem necessidade da alma para isso.
157 No momento da morte, a alma tem, às vezes, um desejo ou
um êxtase que lhe faz entrever o mundo em que vai entrar?
– Muitas vezes a alma sente desfazerem-se os laços que a
prendem ao corpo, então, faz todos os seus esforços para rompê-los completamente.
Já em parte desprendida da matéria, vê o futuro desdobrar-se
à sua frente e desfruta, por antecipação, do estado de Espírito.
158 O exemplo da lagarta, que inicialmente rasteja na terra, depois
se fecha na sua crisálida (1) numa morte aparente para renascer
em uma existência brilhante, pode nos dar uma idéia da vida terrestre,
da vida espiritual e, enfim, de nossa nova existência?
– Uma idéia imperfeita, mas a imagem é boa. Não deverá, entretanto,
ser tomada ao pé da letra, como muitas vezes fazeis.
159 Que sensação experimenta a alma no momento em que reconhece
estar no mundo dos Espíritos?
– Isso depende. Se fizestes o mal com o desejo de fazê-lo, vos envergonhareis
de tê-lo feito, num primeiro momento. Para o justo, é bem
diferente: é como o alívio de um grande peso, porque não teme nenhum
olhar indagador.
160 O Espírito encontra imediatamente aqueles que conheceu
na Terra e que desencarnaram antes dele?
– Sim, de acordo com a afeição que havia entre eles, muitas vezes
vêm recebê-lo na volta ao mundo dos Espíritos e o ajudam a se desprender
das faixas da matéria. Assim como reencontra também muitos que
havia perdido de vista durante sua permanência na Terra. Vê os que estão
na erraticidade (2), como também vai visitar os que estão encarnados.
161 Na morte violenta e acidental, quando os órgãos ainda não
estão enfraquecidos pela idade ou por doenças, a separação da alma
e o término da vida ocorrem simultaneamente?
– Geralmente é simultâneo, mas, em todos os casos, o momento
dessa separação é muito curto.
162 No caso de decapitação, por exemplo, o homem conserva
por alguns instantes a consciência de si mesmo?
– Muitas vezes a conserva durante alguns minutos, até que a vida
orgânica tenha-se extinguido completamente. Mas às vezes ocorre que a
apreensão da morte pode fazer com que perca a consciência mesmo
antes do instante do suplício.
* Trata-se aqui da consciência que o supliciado pode ter de si mesmo,
como homem e por intermédio dos órgãos, e não como Espírito. Se
não perdeu a consciência antes do suplício pode, ainda, conservá-la
por alguns instantes que são de uma duração muito curta e cessa necessariamente
com a vida orgânica do cérebro, o que não implica que o
perispírito esteja completamente desligado do corpo. Pelo contrário: em
todos os casos de morte violenta, quando não acontece pela extinção
natural das forças vitais, os laços que unem o corpo ao perispírito são
muito fortes, e o desprendimento completo demora mais.

1 - Crisálida: estado intermediário entre lagarta e borboleta. No contexto, significa a transformação,
o vir a ser (N. E.).
2 - Veja a questão 223 e seguintes. (N. E.).

sexta-feira, 17 de junho de 2011

RETORNO DA VIDA CORPORAL À VIDA ESPIRITUAL


A ALMA APÓS A MORTE
149 Em que se torna a alma logo após a morte?
– Volta a ser Espírito, ou seja, retorna ao mundo dos Espíritos, que
havia deixado temporariamente.
150 A alma, após a morte, conserva sua individualidade?
– Sim, nunca a perde. O que seria ela se não a conservasse?
150 a Como a alma continua a ter a sua individualidade, uma vez
que não possui mais seu corpo material?
– Ela ainda tem um fluido que lhe é próprio, tomado da atmosfera de
seu planeta e que representa a aparência de sua última encarnação: seu
perispírito.
150 b A alma nada leva consigo deste mundo?
– Nada mais que a lembrança e o desejo de ir para um mundo melhor.
Essa lembrança é cheia de doçura ou amargura, de acordo com o emprego
que fez da vida. Quanto mais pura, mais compreende a futilidade do
que deixa na Terra.
151 O que pensar da opinião de que, após a morte, a alma retorna
ao todo universal?
– O conjunto dos Espíritos não forma um todo? Não constitui um mundo
completo? Quando estais em uma assembléia, sois parte integrante dessa
assembléia e, entretanto, sempre conservais a individualidade.
152 Que prova podemos ter da individualidade da alma após a
morte?
– Não tendes essa prova por meio das comunicações que obtendes?
Se não fôsseis cegos, veríeis; e, se não fôsseis surdos, ouviríeis, pois muito
freqüentemente uma voz vos fala e revela a existência de um ser fora de vós.
* Aqueles que pensam que na morte a alma retorna ao todo universal
estão errados, se por isso entenderem que, semelhante a uma gota
d’água que cai no oceano, perde sua individualidade. Porém, estarão
certos se entenderem por todo universal o conjunto de seres incorpóreos,
do qual cada alma ou Espírito é um elemento.
Se as almas não se diferenciassem no todo, teriam apenas as qualidades
do conjunto e nada poderia distingui-las umas das outras; não
teriam nem inteligência, nem qualidades próprias. Porém, muito ao contrário
disso, em todas as comunicações demonstram ter consciência do
seu eu e uma vontade própria. A diversidade que apresentam em todas
as comunicações é conseqüência da sua individualidade. Se após a
morte houvesse somente o que se chama de o grande Todo que absorve
todas as individualidades, esse Todo seria uniforme e, então, todas
as comunicações do mundo invisível seriam idênticas. Uma vez que lá
se encontram seres bons e maus, sábios e ignorantes, felizes e infelizes,
e de todas as espécies: alegres e tristes, levianos e sérios, etc., é evidente
que são seres distintos. A individualidade torna-se ainda mais evidente
quando esses seres provam sua identidade por manifestações incontestáveis,
por detalhes pessoais relativos à sua vida terrestre que se
podem comprovar. Também não pode ser posta em dúvida quando se
tornam visíveis em suas aparições. A individualidade da alma nos foi
ensinada em teoria, como um artigo de fé. O Espiritismo a torna evidente
e, de certo modo, material.
153 Em que sentido se deve entender a vida eterna?
– É a vida do Espírito que é eterna; porém, a do corpo é transitória e
passageira. Quando o corpo morre, a alma retorna à vida eterna.
153 a Não seria mais exato chamar vida eterna à vida dos Espíritos
puros, aqueles que, tendo atingido o grau de perfeição, não têm
mais provas para suportar?
– Isso é, antes, a felicidade eterna. Porém, mais uma vez, é uma questão
de palavras: chamai as coisas como quiserdes, contanto que vos entendais.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

MATERIALISMO


147 Por que os anatomistas (2), os fisiologistas (3) e em geral os que
se aprofundam nas ciências naturais são, muitas vezes, levados ao
materialismo?
– O fisiologista vê tudo à sua maneira. Orgulho dos homens, que acreditam
saber tudo e não admitem que alguma coisa possa ultrapassar seu
conhecimento. Sua própria ciência lhes dá presunção. Pensam que a natureza
não pode lhes ocultar nada.
148 Não é de lamentar que o materialismo seja uma conseqüência
de estudos que deveriam, ao contrário, mostrar ao homem a superioridade
da inteligência que governa o mundo? Por isso, pode-se
concluir que são perigosos?
– Não é exato dizer que o materialismo seja uma conseqüência desses
estudos. É o homem que tira deles uma falsa conseqüência, porque
tem a liberdade de abusar de tudo, mesmo das melhores coisas. O nada,
aliás, os amedronta mais do que eles demonstram, e os Espíritos fortes
são, muitas vezes, mais fanfarrões do que bravos. A maioria dos materialistas
só o são porque não têm nada para encher o vazio do abismo que se
abre diante deles. Mostre-lhes uma âncora de salvação e se agarrarão a
ela apressadamente.
* Por uma aberração (4) da inteligência, há pessoas que vêem nos seres
orgânicos apenas a ação da matéria e a esta atribuem todos os nossos
atos. Vêem no corpo humano apenas a máquina elétrica; estudaram o
mecanismo da vida apenas pelo funcionamento dos órgãos que muitas
vezes viram se extinguir pela ruptura de um fio, e não viram nada mais que
esse fio.
Procuraram ver se restava alguma coisa e, como encontraram apenas
a matéria, que se tornara inerte, e não viram a alma escapar nem a
puderam apanhar, concluíram que tudo estava nas propriedades da
matéria e que, depois da morte, o pensamento se aniquilava. Triste conseqüência
se fosse assim, porque então o bem e o mal não teriam significação
alguma; o homem seria levado apenas a pensar em si mesmo
e a colocar acima de tudo a satisfação de seus prazeres materiais, os
laços sociais seriam rompidos e as afeições mais santas destruídas para
todo o sempre. Felizmente, essas idéias estão longe de ser gerais, pode-se
até mesmo dizer que são muito limitadas e constituíram apenas opiniões
individuais, porque em nenhuma parte constituíram doutrina. Uma
sociedade fundada sobre essas bases teria em si o germe de sua dissolução,
e seus membros se entredevorariam como animais ferozes (5).
O homem tem o pensamento instintivo de que nem tudo se acaba
quando cessa a vida. Tem horror ao nada. Ainda que teime e resista
inutilmente contra a idéia da vida futura, quando chega o momento supremo
são poucos os que não se perguntam o que vai ser deles; a idéia
de deixar a vida e não mais retornar é dolorosa. Quem poderia, de fato,
encarar com indiferença uma separação absoluta, eterna, de tudo o que
amou? Quem poderia, sem medo, ver abrir-se diante de si o imenso
abismo do nada onde se dissiparão para sempre todas as nossas capacidades,
todas as nossas esperanças, e dizer a si mesmo: “Qual o quê!
Depois de mim, nada, nada mais além do vazio; tudo acabou; daqui a
alguns dias minhas lembranças serão apagadas da memória dos que
me sobreviverem; daqui a pouco não restará nenhum traço de minha
passagem pela Terra; o próprio bem que fiz será esquecido pelos ingratos
a quem servi; e nada pode compensar tudo isso, nenhuma outra
perspectiva além do meu corpo roído pelos vermes!”
Esse quadro não tem alguma coisa de apavorante, glacial? A religião
nos ensina que não pode ser assim, e a razão o confirma. Mas essa
existência futura, vaga e indefinida não nos dá nenhuma esperança, sendo
para muitos a origem da dúvida. Temos uma alma, sim, mas o que é
nossa alma? Ela tem uma forma, uma aparência qualquer? É um ser
limitado ou indefinido? Uns dizem que é um sopro de Deus; outros, uma
centelha; outros, uma parte do grande Todo, o princípio da vida e da
inteligência, mas o que tudo isso nos oferece? O que nos importa ter
uma alma se depois da morte ela se confunde na imensidade como as
gotas d’água no oceano? A perda de nossa individualidade não é para
nós o mesmo que o nada? Diz-se, ainda, que é imaterial; mas uma coisa
imaterial não poderá ter proporções definidas e para nós equivale ao
nada. A religião ainda nos ensina que seremos felizes ou infelizes, conforme
o bem ou o mal que tivermos feito. Mas em que consiste essa
felicidade que nos espera no seio de Deus? É uma beatitude, uma contemplação
eterna, sem outra ocupação a não ser a de cantar louvores
ao Criador? As chamas do inferno são uma realidade ou um símbolo? A
própria Igreja as entende nesta última significação, mas quais são aqueles
sofrimentos? Onde está esse lugar de suplício? Numa palavra, o que se
faz, o que se vê, nesse mundo que nos espera a todos? Diz-se que
ninguém voltou de lá para nos prestar contas.
É um erro dizer isso. A missão do Espiritismo é precisamente a de
nos esclarecer sobre esse futuro, de nos fazer, até certo ponto, tocá-lo
e vê-lo, não mais só pelo raciocínio, mas apresentando fatos. Graças às
comunicações espíritas, isso não é uma presunção, uma probabilidade
que cada um entende à sua maneira, que os poetas embelezam com
suas ficções ou pintam de imagens alegóricas que nos enganam. É a
realidade que nos aparece, pois são os próprios Espíritos que vêm nos
descrever sua situação, nos dizer o que foram, o que nos permite assistir,
por assim dizer, a todas as peripécias de sua nova vida e, por esse
meio, nos mostram a sorte inevitável que nos está reservada, de acordo
com nossos méritos e deméritos. Há nisso algo de anti-religioso? Bem
ao contrário, uma vez que os incrédulos aí encontram a fé e os indecisos
a renovação de fervor e de confiança. O Espiritismo é o mais poderoso
auxiliar da religião. E se é assim, é porque Deus o permite e o permite
para reanimar nossas esperanças vacilantes e nos reconduzir ao caminho
do bem mediante a perspectiva do futuro.


2 - Anatomista: profissional que estuda a forma e a estrutura dos órgãos do corpo humano
(N. E.).
3 - Fisiologista: profissional que estuda o funcionamento das atividades vitais do corpo humano:
crescimento, respiração, pensamento, etc. (N. E.).
4 - Aberração: desvio, distorção, desatino (N. E.).
5 - Como animais ferozes: embora Kardec tenha escrito isso há quase 150 anos, os sistemas
políticos que se basearam na doutrina materialista se autodissolveram por si, não tiveram continuidade
(N. E.).

quarta-feira, 15 de junho de 2011

A ALMA


134 O que é a alma?
– Um Espírito encarnado.
134 a O que era a alma antes de se unir ao corpo?
– Um Espírito.
134 b As almas e os Espíritos são, portanto, uma e a mesma
coisa?
– Sim, as almas são os Espíritos. Antes de se unir ao corpo, a alma é
um dos seres inteligentes que povoam o mundo invisível e se revestem
temporariamente de um corpo carnal para se purificar e se esclarecer.
135 Há no homem outra coisa mais que a alma e o corpo?
– Há o laço que une a alma ao corpo.
135 a Qual é a natureza desse laço?
– Semimaterial, ou seja, de natureza intermediária entre o Espírito e o
corpo. É preciso que assim seja para que possam se comunicar um com
o outro. É por esse princípio que o Espírito age sobre a matéria e vice-
versa.
* Desse modo, o homem é formado de três partes essenciais:
1a ) O corpo ou ser material, semelhante ao dos animais e animado
pelo mesmo princípio vital;
2a ) A alma, Espírito encarnado que tem no corpo a sua habitação;
3a ) O princípio intermediário ou perispírito, substância semimaterial
que serve de primeiro envoltório ao Espírito e une a alma ao corpo físico.
São como num fruto: a semente, o perisperma e a casca.
136 A alma é independente do princípio vital?
– O corpo é apenas o envoltório, repetimos isso constantemente.
136 a O corpo pode existir sem a alma?
– Sim, pode; porém, desde que cesse a vida no corpo, a alma o
abandona. Antes do nascimento, não há união definitiva entre a alma e o
corpo; ao passo que, depois que essa união está estabelecida, só a morte do
corpo rompe os laços que o unem à alma, que o deixa. A vida orgânica
pode animar um corpo sem alma, mas a alma não pode habitar um corpo
em que não há vida orgânica.
136 b O que seria nosso corpo se não houvesse alma?
– Uma massa de carne sem inteligência, tudo o que quiserdes, exce-
to um ser humano.
137 Um mesmo Espírito pode encarnar em dois corpos diferen-
tes ao mesmo tempo?
– Não; o Espírito é indivisível e não pode animar simultaneamente dois
seres diferentes. (Veja O Livro dos Médiuns, Segunda Parte, cap. 7 – Da
Bicorporeidade e da Transfiguração.)
138 Que pensar daqueles que consideram a alma como o princí-
pio da vida material?
– É uma questão de palavras que não nos diz respeito. Começai por
vos entenderdes a vós mesmos.
139 Alguns Espíritos e, antes deles, alguns filósofos definiram
assim a alma: “Uma centelha anímica emanada do grande Todo”. Por
que essa contradição?
– Não há contradição; depende da significação das palavras. Por que
não tendes uma palavra para cada coisa?
* A palavra alma é empregada para exprimir coisas muito diferentes.
Uns chamam alma o princípio da vida, e com esse entendimento é exato
dizer, em sentido figurado, que a alma é “uma centelha anímica emana-
da do grande Todo”. Essas últimas palavras indicam a fonte universal do
princípio vital do qual cada ser absorve uma porção que, depois da
morte, retorna à massa. Essa idéia não exclui a de um ser moral distinto,
independente da matéria e que conserva sua individualidade. É esse ser
que se chama, igualmente, alma, e é nesse sentido que se pode dizer que
a alma é um Espírito encarnado. Ao dar à alma definições diferentes, os
Espíritos falaram conforme a idéia que faziam da palavra e de acordo
com as idéias terrestres de que ainda estavam mais ou menos imbuí-
dos. Isso decorre da insuficiência da linguagem humana, que não tem
uma palavra para cada idéia, gerando uma infinidade de enganos e dis-
cussões. Eis por que os Espíritos superiores nos dizem que nos enten-
damos primeiro acerca das palavras (Ver na Introdução explicação mais
detalhada de alma).
140 O que pensar da teoria da alma subdividida em tantas partes
quanto os músculos e sendo responsável, assim, por cada uma das
funções do corpo?
– Isso depende ainda do sentido que se dá à palavra alma. Se a
entendermos como o fluido vital, tem razão; mas se queremos entendê-la
como Espírito encarnado, é errada. Como já dissemos, o Espírito é indivi-
sível. Ele transmite o movimento aos órgãos pelo fluido intermediário, sem
se dividir.
140 a Entretanto, há Espíritos que deram essa definição.
– Espíritos ignorantes podem tomar o efeito pela causa.
* A alma atua por intermédio dos órgãos e os órgãos são animados
pelo fluido vital, que se reparte entre eles e se concentra mais fortemente
nos órgãos que são os centros ou focos do movimento. Conseqüente-
mente, não procede a idéia de igualar a alma ao fluido vital, se por alma
queremos dizer o Espírito que habita o corpo durante a vida e o abandona
na morte.
141 Há alguma verdade na opinião dos que pensam que a alma
é exterior e envolve o corpo?
– A alma não está aprisionada no corpo como um pássaro numa
gaiola. Irradiante, ela brilha e se manifesta ao redor dele como a luz através
de um globo de vidro ou como o som ao redor de um centro sonoro. É
desse modo que se pode dizer que é exterior, mas não é o envoltório do
corpo. A alma tem dois envoltórios ou corpos: um sutil e leve, que é o
primeiro, chamado perispírito; o outro, grosseiro, material e pesado, que é
o corpo carnal. A alma é o centro de todos esses envoltórios, como o
germe o é numa semente, como já dissemos.
142 O que dizer desta outra teoria segundo a qual a alma, numa
criança, se completa a cada período de vida?
– O Espírito é um só, está completo na criança como no adulto. Os
órgãos ou instrumentos das manifestações da alma é que se desenvol-
vem e se completam. Nesse caso é ainda tomar o efeito pela causa.
143 Por que todos os Espíritos não definem a alma da mesma
maneira?
– Os Espíritos não são todos igualmente esclarecidos sobre estas
questões. Há Espíritos cujos conhecimentos são ainda limitados e não
compreendem as coisas abstratas, como ocorre entre vós com as crian-
ças. Há também Espíritos pseudo-sábios, que fazem rodeio de palavras
para se impor; aliás, como acontece entre vós. Mas, além disso, os próprios
Espíritos esclarecidos podem se exprimir em termos diferentes que, no
fundo, têm o mesmo significado, especialmente quando se trata de coisas
para as quais a vossa linguagem é inadequada para exprimir claramente,
precisando de figuras e comparações que tomais como realidade.
144 O que se deve entender por alma do mundo?
– O princípio universal da vida e da inteligência de onde nascem as
individualidades. Mas aqueles que se servem dessas palavras freqüente-
mente não se compreendem uns aos outros. A palavra alma tem uma
aplicação tão elástica que cada um a interpreta de acordo com a sua
imaginação. Já se atribuiu, também, uma alma à Terra, o que é preciso
entender como sendo o conjunto de Espíritos devotados que dirigem as
vossas ações no bom caminho quando os escutais, e que são, de algum
modo, os representantes de Deus em relação ao vosso globo.
145 Como tantos filósofos antigos e modernos têm discutido por
tanto tempo sobre a ciência psicológica sem ter chegado à verdade?
– Esses homens eram os precursores da Doutrina Espírita eterna. Eles
prepararam os caminhos. Eram homens e se enganaram, tomaram suas
próprias idéias pela luz. Mas os próprios erros servem para deduzir a ver-
dade ao mostrar os prós e os contras. Aliás, entre esses erros se encontram
grandes verdades, que um estudo comparativo tornará compreensíveis (1).
146 A alma tem uma sede determinada e circunscrita no corpo?
– Não, mas está mais particularmente na cabeça entre os grandes
gênios, os que pensam muito, e no coração nos que têm sentimentos
elevados e cujas ações beneficiam toda a humanidade.
146 a Que pensar da opinião daqueles que colocam a alma num
centro vital?
– Isso quer dizer que o Espírito se localiza, de preferência, nessa parte
do vosso organismo, uma vez que é para aí que convergem todas as
sensações. Aqueles que a colocam no que consideram como centro da
vitalidade a confundem com o fluido ou princípio vital. Contudo, pode-se
dizer que a sede da alma está mais particularmente nos órgãos que ser-
vem às manifestações intelectuais e morais.

1 - Compare essa resposta com a da questão 628 (N. E.).