terça-feira, 10 de maio de 2011

13. CONTRADIÇÕES ENTRE OS ESPÍRITOS


As observações nos levam a dizer algumas palavras a respeito de
uma outra dificuldade, a da divergência na linguagem dos Espíritos.
Como os Espíritos são muito diferentes uns dos outros nos conhe-
cimentos e na moralidade, é evidente que a mesma questão pode ser
por eles explicada com sentidos opostos, conforme a categoria que
ocupam, como se ela fosse proposta, entre os homens, ora a um sá-
bio, ora a um ignorante ou a um gracejador de mau gosto. O ponto
essencial, já o dissemos, é saber a quem se dirige.
Mas, dizem os críticos: como se explica que os Espíritos reconhe-
cidos por seres superiores não estejam sempre de acordo? Diremos,
primeiramente, que além da causa que acabamos de assinalar há
outras que podem exercer uma certa influência sobre a natureza das
respostas, independentemente da qualidade dos Espíritos. Este é um
ponto importante cuja explicação somente será dada pelo estudo. É
por isso que dizemos que esses estudos requerem uma atenção fir-
me, uma observação profunda e, principalmente, como em todas as
ciências humanas, continuidade e perseverança. São necessários anos
para fazer um médico medíocre, três quartos da vida para fazer um
sábio; como pretender, em algumas horas, adquirir a ciência do infini-
to? Portanto, não nos enganemos: o estudo do Espiritismo é imenso,
toca em todas as questões da metafísica (22) e da ordem social, é todo
um mundo que se abre diante de nós; será de espantar que seja pre-
ciso tempo, e muito tempo, para o adquirir?
A contradição, aliás, não é sempre tão evidente quanto pode pa-
recer. Não vemos, todos os dias, homens que, ensinando a mesma
ciência, divergem quanto à definição de uma coisa, seja ao empregar
termos diferentes, seja ao encará-la sob um outro ponto de vista, ain-
da que a idéia fundamental permaneça a mesma? Que se conte, se
possível, o número de definições que foram dadas pela gramática!
Acrescentamos ainda que a forma da resposta depende, muitas vezes,
da forma da pergunta. Seria ingenuidade encontrar uma contradição
onde há apenas uma diferença de palavras. Os Espíritos Superiores
não se prendem de nenhum modo à forma; para eles, o fundo do
pensamento é tudo.
Tomemos por exemplo a definição da alma. Por essa palavra com-
portar várias significações, os Espíritos podem, assim como nós, di-
vergir na definição que lhe dão: um poderá dizer que é o princípio da
vida; um outro, chamá-la de centelha anímica (23); um terceiro, dizer que
é interna; um quarto, que é externa, etc., e todos terão razão em seu
ponto de vista. Poderíamos até mesmo acreditar que alguns deles,
em vista da sua definição, ensinassem teorias materialistas e, entre-
tanto, não é assim. Ocorre o mesmo em relação a Deus; Ele será: o
Princípio de todas as coisas, o Criador do universo, a Soberana inte-
ligência, o Infinito, o Grande Espírito, etc., etc. e decisivamente será
sempre Deus. Citamos, por fim, a classificação dos Espíritos. Eles
formam uma escala contínua desde o grau inferior até o superior; por-
tanto, a classificação não é rígida: um poderia estabelecer três clas-
ses; um outro, cinco, dez ou vinte, à vontade, sem estar, por isso, em
erro. Também as ciências humanas nos oferecem o exemplo: cada
sábio tem o seu sistema, os sistemas mudam, mas a ciência não. Que
se aprenda botânica pelo sistema de Lineu, de Jussieu ou de Tourne-
fort (24) e não será menos botânica. Deixemos de dar, portanto, às coi-
sas de pura convenção mais importância do que merecem, para nos
ocupar daquilo que é verdadeiramente sério, e a reflexão nos fará
descobrir, muitas vezes, naquilo que parece mais contraditório, uma
semelhança que nos havia escapado à primeira vista.
22 - Metafísica: é parte da filosofia, um conjunto de conhecimentos racionais (e não de conheci-
mentos revelados) em que se procura determinar as regras fundamentais do pensamento, e que
nos dá a chave do conhecimento do real em oposição à aparência (N. E.).
23 - Centelha anímica: princípio da vida espiritual; corpo espiritual; o Espírito (N. E.).

24 - Lineu, Jussieu e Tournefort: naturalistas e botânicos, sendo o primeiro sueco e os outros

dois franceses (N. E.).



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